Astronauta Marcos Pontes

Retrocesso na Produção Científica Brasileira: Queda de 7,2% em 2023

Impacto e comparações internacionais: é preciso entender a desaceleração no Brasil para encontrar soluções para a retomada do crescimento

Senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)
Foto: Foto: Assessoria
Senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)


As publicações de artigos científicos caíram 7,2% no Brasil em 2023. É o que mostra o relatório da  Bori-Elsevier divulgado em julho de 2024: “2023: ano de queda na produção científica de 35 países, inclusive o Brasil”. Com essa regressão, o número de artigos publicados no ano passado retorna aos níveis de 2019, antes da pandemia do coronavírus. Em dois anos, a quantidade de artigos diminuiu de 80,5 mil para menos de 69 mil. Até essa queda, a produção científica brasileira manteve um crescimento constante por 25 anos.

A área de ciências médicas foi a mais afetada, com uma queda de 10% na produção de artigos. Entre as 31 instituições de pesquisa mais importantes do país, com mais de mil textos científicos publicados, apenas duas não apresentaram redução na atividade científica: as universidades federais de Juiz de Fora (UFJF) e de Pernambuco (UFPE).

A variação percentual entre 2022 e 2023 em Grandes Áreas do Conhecimento, segundo a Elsevier SciVal 2024 é:

Ciências Médicas: -10%

Ciências Agrárias: -6%

Ciências da Natureza: -7%

Engenharia e Tecnologias: -7%

Ciências Sociais: -4%

Humanidades: -2%

Total: -7%

A queda é mundial. Entre os 53 países analisados, cada um com mais de 10 mil artigos científicos publicados em 2022, 35 apresentaram uma variação negativa na produção científica em 2023, incluindo Estados Unidos (-3,5%), Japão (-5,6%) e Austrália (-4,1%). O Brasil ocupa a 40ª posição na lista de países com maior Taxa Anual de Crescimento Composta (TCAC) entre 2013 e 2023, com um crescimento de 3,5%. Países como Iraque, Indonésia e Etiópia mostraram uma TCAC superior a 20% no mesmo período. Nosso país permanece em 14º lugar, mesmo com a queda na produção.

O volume de artigos é considerado um indicador do trabalho dos cientistas, permitindo que outros pesquisadores revisem e comparem os resultados.. Segundo a editora Elsevier, perder ritmo de publicação científica significa produzir menos conhecimento e menos soluções para questões como tratamento de doenças, otimização da agropecuária ou enfrentamento de problemas sociais como a violência urbana.


Ainda segundo o estudo, a área de biotecnologia em saúde humana é marcada pela dependência do setor privado em relação aos investimentos públicos para pesquisa e desenvolvimento (P&D). Além disso, observa-se uma baixa capacidade de inovação na cadeia de novas drogas e uma desconexão entre os avanços em ciência e tecnologia e a inovação. Ao analisar três dimensões da ciência, tecnologia e inovação (CT&I) para a biotecnologia em saúde humana no Brasil – distribuição geográfica, produção científica e P&D em empresas –, fica claro que, apesar dos avanços realizados em C&T, ainda é necessário superar diversas fraquezas para alcançar um crescimento econômico sustentado pelo conhecimento e inovação.

É preciso entender o processo de desaceleração que acontece na produção científica brasileira para encontrar as soluções necessárias para a volta do crescimento do conhecimento.

Estimativas globais apontam que o mercado de biotecnologia crescerá mais de 13,96% anualmente até 2030, com valor de mercado em 2024 de USD 1,76 trilhão e previsão de receitas em 2030 de USD 3,88 trilhões, segundo a  Grand ViewResearch. A crescente presença da medicina personalizada e o aumento no número de formulações de medicamentos órfãos estão abrindo novos caminhos para aplicações biotecnológicas, fomentando a entrada de empresas emergentes e inovadoras no setor e, consequentemente, aumentando ainda mais a receita.

No Brasil, o mercado também está aquecido. O estudo  “BrazilBiotechnology Market Overview 2024-2028”, publicado no Report Linker, diz que o setor de biotecnologia no país está prestes a enfrentar uma transformação significativa nos próximos anos. O mercado, que deve atingir 100 bilhões de USD até 2025, é impulsionado pelo aumento da demanda por tratamentos médicos avançados e terapias. Com um crescimento previsto de 7,5% ao ano, o setor de biotecnologia do Brasil está preparado para testemunhar avanços em pesquisa e desenvolvimento, produção de biofármacos e soluções inovadoras em biotecnologia. Graças a esse crescimento, abrem-se oportunidades no setor agrícola, bem como no setor médico, para inovações biotecnológicas. A mudança para fontes de energia mais ecológicas também é uma consideração importante. Produtos desenvolvidos a partir da biodiversidade são foco de investimentos e projetos dos setores público e privado. As iniciativas governamentais apoiam pesquisas e inovações em laboratórios locais, oferecendo incentivos fiscais e subsídios para catalisar novos projetos.

Em 2020, como Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, o Astronauta Marcos Pontes lança a Plataforma Nacional de Infraestrutura e Pesquisa (PNIPE), plataforma para laboratórios e equipamentos científicos brasileiros que reúne informações e facilita o acesso e compartilhamento entre pesquisadores e empresas.
Foto: Foto: Neila Rocha - Ascom / MCTI
Em 2020, como Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, o Astronauta Marcos Pontes lança a Plataforma Nacional de Infraestrutura e Pesquisa (PNIPE), plataforma para laboratórios e equipamentos científicos brasileiros que reúne informações e facilita o acesso e compartilhamento entre pesquisadores e empresas.


Durante a minha gestão no Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI), em 2021, criamos a Rede Brasil-Biotec para promover o avanço científico nas áreas: saúde humana, agropecuária, industrial e ambiental marinha. O objetivo é organizar um ambiente de interação entre empresas privadas, governo e institutos de pesquisas para transformar o conhecimento em produtos.

Apesar do Brasil ter uma forte base acadêmica e crescente interesse internacional, há desafios significativos para transformar avanços científicos em inovações comerciais. As políticas públicas, como as parcerias para desenvolvimento produtivo na saúde e o uso do poder de compra do governo, são essenciais para estimular o desenvolvimento tecnológico e reduzir a dependência de importações. Contudo, a interação entre universidade e empresa, e o investimento do setor privado em P&D, ainda precisam ser fortalecidos para que o setor de biotecnologia em saúde humana contribua efetivamente para o desenvolvimento econômico baseado em inovação no Brasil. É o que diz o artigo “Política de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (CT$I/S): uma atualização para debate”, publicado na Scientific Eletronic Library Online.

Há poucos meses, a revista NATURE, uma das mais renomadas revistas científicas do mundo, publicou um artigo descrevendo cortes nas bolsas de estudo para pesquisadores brasileiros do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Segundo o texto, a medida aconteceu após o corte de R$ 310 milhões das universidades federais realizado pelo governo federal. Já o governo diz que aumentou o número de bolsas, mas reconhece que programas de qualidade sofreram perdas. Com mudanças nos critérios adotados, ocorreu diminuição de bolsas em determinados programas e instituições bem qualificadas.

Recentemente, o ex-ministro de Ciência e Tecnologia (2005-2010), Sérgio Rezende, criticou a falta de investimento do governo federal em ciência e tecnologia e ressaltou que é muito pouco o repasse da porcentagem do PIB para o setor, “Não podemos ficar nesse 1,3%. Quem paga R$ 700 milhões de dívida não é um país pobre. Deveria usar melhor seus recursos”, disse o ex-ministro.

Essa trajetória criada pelo Brasil é oposta às estratégias elaboradas por países como Israel e Coreia do Sul que investem mais de 4% do PIB nessa área. China, Alemanha e Austrália têm investimentos superiores a 2% do PIB. Como senador, tive a iniciativa de propor uma proposta de emenda à Constituição  (PEC 31/2023), a PEC da Ciência, que estabelece o aumento gradual dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação até atingir, no mínimo, 2,5% do PIB em 2033. Ainda como ministro, estabeleci, com a minha equipe, duas novas fontes de investimento para a pasta: a plataforma investMCTI, que atrai investidores privados, e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Eu iniciei o meu mandato como ministro com uma dívida de R$ 350 milhões em bolsas e encerrei com R$ 9 bilhões disponíveis para ciência e tecnologia.

Outros projetos de lei, de minha autoria, ligados a esse setor, estão em tramitação no Senado Federal. Como o projeto de lei  (PL 3218/2023) que Altera a Lei nº 11.540, de 12 de novembro de 2007, que dispõe sobre o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT, para determinar que 10% (dez por cento) dos recursos do FNDCT sejam destinados para popularização da Ciência, Tecnologia e Inovação – CT&I. O objetivo desta proposta é estimular a educação voltada para a ciência e a tecnologia, com o intuito de capacitar professores e oferecer oportunidades para jovens de todo país. Importante destacar que o FNDCT foi criado para apoiar financeiramente programas e projetos de desenvolvimento científico e tecnológico nacionais, tendo como fonte de receita incentivos fiscais, empréstimos de instituições financeiras, contribuições e doações de entidades públicas e privadas. 

Já o  PRS 32/2023 cria a Frente Parlamentar Mista de Pesquisa Biomédica e sua aplicação na Saúde. O objetivo da Frente é unir o legislativo para compreender a importância do desenvolvimento das pesquisas científicas para melhorar a saúde e o bem-estar dos brasileiros, além de ampliar o estudo e a aplicação do conhecimento produzido em nosso país ou trazido do exterior, a fim de disponibilizar tais tecnologias de ponta e as inovações para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Na segunda-feira, dia 05 de agosto, faremos o lançamento da Frente Parlamentar Mista de Pesquisa Biomédica. O evento será, às 9h, no Plenário 2, do Anexo II, Ala Senador Nilo Coelho, e terá a cobertura ao vivo no meu canal do youtube:  youtube.com/@astropontes.

O Brasil, com uma das maiores biodiversidades do mundo, tem grande potencial para desenvolver novos tratamentos para doenças incuráveis. A pesquisa biomédica, abrangendo áreas como doenças raras, câncer e diabete, pode atender às demandas sociais e promover o desenvolvimento econômico. Instituições como FeSBE, Fiocruz, Instituto Butantan e INCA, com o Congresso Nacional, podem aplicar o conhecimento científico para resolver problemas de saúde da população. Isso contribuirá para a segurança nacional, bem-estar da população e redução dos custos de tratamento. Investir em pesquisa impulsiona novas tecnologias que aumentam a produtividade do país, uma variável essencial para alcançar incrementos no crescimento econômico.

Ciência e tecnologia são pilares fundamentais para o avanço da saúde no Brasil. A pesquisa científica desempenha um papel crucial no desenvolvimento de novas aplicações e tratamentos que podem transformar a vida de milhões de pessoas. Investir em pesquisa biomédica não apenas responde às necessidades urgentes da sociedade, mas também abre caminhos para o crescimento econômico sustentável. Ao valorizar e apoiar os esforços dos nossos pesquisadores e instituições, estamos construindo um futuro mais saudável e promissor para todos os brasileiros. A ciência e a tecnologia, quando bem aplicadas, têm o poder de proporcionar soluções inovadoras e acessíveis, garantindo mais qualidade de vida e bem-estar para a nossa população.

** Marcos Pontes é mestre em Engenharia de Sistemas e o primeiro astronauta profissional a representar oficialmente um país do hemisfério sul no espaço. Foi ministro das Comunicações (2019-2020) e da Ciência, Tecnologia e Inovações (2020-2022). Atualmente é senador da República por São Paulo, cargo para o qual foi eleito com mais de 10,7 milhões de votos. Entusiasta do avanço das tecnologias de inteligência artificial, defende o desenvolvimento econômico e social do país por meio do conhecimento, da educação, da ciência, da tecnologia, da inovação e do empreendedorismo.