Aumento de 54% no tempo de tela mostra piora em estilo de vida na pandemia

Tempo de tela subiu de 6,5 para 10 horas diárias durante isolamento social

Tempo de tela aumentou entre brasileiros na pandemia
Foto: Unsplash/Jenny Ueberberg
Tempo de tela aumentou entre brasileiros na pandemia

A qualidade de vida dos brasileiros diminuiu na pandemia de Covid-19. Além da doença e do luto em si, medidas de isolamento social fizeram as pessoas ficarem mais tempo diante de telas. Ao mesmo tempo, também houve mudanças para pior nos hábitos de alimentação e atividade física. É o que mostra um estudo feito por cientistas de quatro universidades brasileiras.

Por meio de mais de 1.300 questionários online realizados entre agosto e setembro de 2020, as pesquisadoras detectaram um aumento de 3,5 horas no tempo de tela dos brasileiros. A mediana dos questionários pulou de 6,5 para 10 horas diante de celulares, computadores, TVs e outros aparelhos eletrônicos, um aumento de 54%.

A maioria da amostra estava trabalhando e/ou estudando de casa em tempo integral ou parcial, o que influenciou o resultado. Por outro lado, alguns grupos aparentaram uma tendência inversa a grandes períodos diante de displays: pessoas mais velhas, que continuaram trabalhando ou estudando presencialmente, que tiveram aumento no trabalho e nas tarefas domésticas ou que passaram a praticar mais exercícios físicos.

Mais tempo de tela piora a alimentação

O trabalho argumenta que o tempo excessivo usando telas, apesar de aliviar momentos de solidão em meio ao isolamento, interfere negativamente nas escolhas alimentares. Esse comportamento está ligado a um alto consumo de comidas ultraprocessadas e frituras.

Outras descobertas do estudo também reforçam que a qualidade das refeições piorou: o consumo de frutas e verduras caiu, enquanto pães e doces, comidas instantâneas e fast food estiveram mais presentes no cardápio.

Outro fator que parece ter impacto na alimentação é o tempo de sono. O número de horas dormidas aumentou, muito provavelmente porque não era mais necessário se deslocar até o trabalho. Isso, porém, levou a uma diminuição no número de pessoas tomando café da manhã e fazendo lanches antes do almoço e a um aumento de quem fazia lanches à noite.

O estudo ainda detectou uma queda no tempo e na frequência de atividades físicas, um aumento na frequência do consumo de bebidas alcoólicas (mas com doses menores) e de cigarros (mas sem aumento na quantidade por dia).

Outros estudos mostram resultados semelhantes

As próprias pesquisadoras reconhecem no texto que seu estudo tem limitações. Ele foi feito a partir de um questionário online respondido sem auxílio, o que pode levar a erros no preenchimento. Além disso, esse método exclui quem não tem acesso à internet.

Por isso, ele não reflete exatamente a população brasileira — 80% das pessoas que responderam eram mulheres, por exemplo, o que é uma grande distorção, e a porcentagem de pessoas que não tiveram chance de trabalhar de casa deve ser bem maior que os 11% encontrados entre quem enviou respostas.

Mesmo assim, o estudo encontrou resultados parecidos com trabalhos de outros países, como Canadá e Irã. Uma pesquisa mais ampla (com 40 mil participantes) e com estratificação mais fiel à população brasileira também encontrou aumento no sedentarismo ligado a uma maior exposição a telas e queda na qualidade da alimentação, com menor consumo de frutas e hortaliças.

E outras pesquisas vão na mesma linha e mostram uma queda geral na qualidade de vida: um levantamento global feito pela Microsoft em 2020 também identificou aumento do estresse e da demanda de trabalho, levando a uma maior sensação de esgotamento.

O trabalho foi realizado por pesquisadoras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade Federal de Viçosa (UFV), da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). O estudo rendeu artigos nas revistas Public Health Nutrition e Frontiers in Nutrition.