Pessoa idosa caída
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Pessoa idosa caída


Após um acidente envolvendo sua sogra, que tem Parkinson e caiu no corredor de casa, o engenheiro de telecomunicações  Lucas Mindêllo  decidiu criar um sensor de detecção de quedas , o FALLR1. A queda ocasionou fratura no maxilar e dez pontos no queixo.

Desenvolvido de forma independente em sua própria casa, o sensor utiliza tecnologia de radar e o protocolo de conectividade Matter, o que permite integração com diversos sistemas de automação residencial .

Lucas, que já atuava com automação residencial, importou módulos específicos da China e fez a adaptação para o mercado nacional, desenvolvendo desde o design 3D até a montagem eletrônica.

O sensor, ao contrário de modelos que usam câmeras, mantém a privacidade e pode ser usado até em banheiros

Como o sensor funciona

O FALLR1 detecta quedas por meio de radar com 90% de precisão e atua também como sensor de presença.

Ele cobre uma área circular de cerca de 13 m² , mas precisa de instalação correta para funcionar.

“S e a pessoa cair do lado da cama e não tiver visão direta, o sensor não vai conseguir identificar essa queda. Então existe uma importância muito grande na colocação em um local correto ”, alerta Lucas.

Sensor de queda Matter – FallR1
Mindêllo Casas Inteligentes/Reprodução
Sensor de queda Matter – FallR1


Três parâmetros ajustáveis garantem a calibração: altura do sensor, sensibilidade e tempo de detecção.

A queda só é confirmada se a pessoa permanecer imóvel por tempo determinado, entre 05 e 90 segundos. A partir disso, sistemas de automação podem acionar alarmes, luzes, enviar notificações ou fazer chamadas.

A conexão à internet é necessária apenas para configurar o dispositivo e integrá-lo aos sistemas. Uma vez calibrado, ele opera de forma autônoma na rede local.

Um diferencial é a adoção do protocolo Matter , que padroniza a comunicação entre dispositivos de diferentes marcas.

Isso permite que o FALLR1 se integre a assistentes de voz, sistemas de iluminação e segurança. “ Hoje cada marca tem seu próprio protocolo, o que dificulta muito. O Matter quebra essa barreira ”, explica o criador.

Brasil ultrapassa projeção de quedas

O Brasil registrou 179.922 internações hospitalares de pessoas idosas em 2024 devido a quedas acidentais, número que superou tanto o total de 2023, com 177.545 casos, quanto a projeção feita para 2025, de 150 mil internações.

O custo médio por internação foi de R$ 1.821,92, gerando um gasto total de aproximadamente R$ 328 milhões ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Apesar de serem eventos considerados evitáveis, os acidentes continuam crescendo acima do esperado e já superam também a previsão de gastos para o próximo ano, que era de R$ 260 milhões. As informações são do banco de dados do SIH-SUS e de estudo de Novaes (2023).

Ao longo do ano de 2024, 13.385 mortes resultaram de episódios de quedas em pessoas idosas.  Em 2023, o número de óbitos foi ainda maior: 16.385.

Idosos são os mais afetados por quedas

Segundo a fisioterapeuta e professora  Drª. Karina Gramani-Say , docente do Departamento de Gerontologia da UFSCar e coordenadora do Laboratório de Estudo da Dor e Funcionalidade no Envelhecimento, as principais causas das quedas incluem desequilíbrio postural, fraqueza muscular, tonturas, ambientes inseguros e o próprio medo de cair.

" Estima-se que 30% dos adultos acima de 65 anos sofrem quedas, associadas ou não a desfechos negativos, que podem trazer consequências leves, como escoriações, isolamento social, perda da autonomia ou graves, como fraturas (fêmur, punho/rádio e coluna), traumas crânioencefálico, seguidas de hospitalizações e até mesmo óbito ", destaca a professora.

A pesquisadora afirma que tecnologias como os sensores de queda são especialmente úteis para pessoas idosas com demência ou que moram sozinhas . “A impossibilidade de levantar do chão, ou demora no socorro dos idosos que não conseguem se levantar está ligada ao bom prognóstico de reabilitação pós-quedas”, diz.

No entanto, o custo e a escolaridade dos idosos ainda são barreiras, segundo a pesquisadora. “ É importante dizer que o SUS disponibiliza bengalas, cadeiras de rodas e andadores, mas ainda não se tem uma política pública para fornecer esse tipo de tecnologias de cuidado e proteção pelo Sistema Público ”, relata Karina.


Prevenção exige ações integradas no sistema de saúde

Karina reforça que, além das alternativas tecnológicas é preciso também ações públicas, como a “ implementação de avaliação multidimensional da pessoa idosa para a manutenção do envelhecimento saudável na Atenção Primária em Saúde ", ação defendida pela Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa  (PNSPI) desde 2006. Assim como "que a pessoa idosa seja avaliada pelo menos 1 vez ao ano", complementa.

A Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa é um instrumento de avaliação previsto na PNSPI que permite uma análise ampla da saúde e das condições de vida da pessoa idosa, considerando aspectos físicos, mentais, sociais e de funcionalidade. Esta avaliação visa identificar precocemente fragilidades e riscos, ajudando a planejar intervenções personalizadas e promover o cuidado centrado na pessoa idosa.

Ainda dentro das ações públicas, a doutora inclui a necessidade de " avaliação específica para quedas e seus fatores de risco em caso de histórico e a implementação no SUS de programas de prevenção ”.

Ela também defende a criação de programas públicos de prevenção com foco multidisciplinar e destaca a realização do II Simpósio Internacional sobre Prevenção de Quedas em Idosos, ocorrido em São Paulo em novembro de 2024, com mais de 500 participantes.

Expectativas para o futuro do produto

Com boa recepção inicial, Lucas planeja buscar investimentos para produzir o sensor em maior escala e expandir a distribuição para fora do Brasil, como Europa e Estados Unidos.

Ele acredita que a automação deve ser acessível e voltada à qualidade de vida, especialmente de idosos.

Automação não é luxo. Automação é melhora de qualidade de vida das pessoas, é fazer com que elas consigam viver e se relacionar da melhor forma com suas residências”, defende o profissional.

Entre os exemplos, ele cita sensores que ligam luzes ao sair da cama à noite, assistentes de voz que realizam chamadas com familiares, e fechaduras eletrônicas acionadas remotamente.

“Se salvar uma vida, eu já estarei satisfeito”, comenta o engenheiro sobre o sensor.

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