As Tecnologias vão Substituir os Servidores Públicos? Uma Análise do Impacto da Automação no Setor Público Brasileiro

A relação entre tecnologia e trabalho é um tema central no século XXI. No setor público, a digitalização e a automação prometem maior eficiência, redução de custos e transparência, mas também levantam questões sobre o futuro dos servidores públicos. Este artigo reflete como tecnologias como Inteligência Artificial (IA), blockchain e plataformas digitais podem substituir ou transformar funções públicas no Brasil, com ênfase no impacto econômico e social, especialmente no Distrito Federal, estados e municípios cuja economia depende massivamente dos empregos públicos.
Quantitativo de Servidores Públicos no Brasil
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022), o Brasil possui aproximadamente 11,5 milhões de servidores públicos, distribuídos em:
- Federal: 1,1 milhão (9,5%)
- Estadual: 2,8 milhões (24,3%)
- Municipal: 7,6 milhões (66,2%)
A concentração municipal reflete serviços como saúde e educação, enquanto o federal inclui órgãos como Receita Federal e Forças Armadas. Estados como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro concentram 40% dos servidores estaduais, muitas vezes em regiões onde a economia local gira em torno do funcionalismo.
Tecnologias e Impacto nas Carreiras Públicas
Carreiras Administrativas
- Funções: Atendimento ao público, processamento de documentos, gestão de arquivos.
- Tecnologias: Chatbots (IA) para atendimento automatizado, RPA (Automação Robótica de Processos) para fluxos burocráticos.
- Dados: Um estudo da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, 2021) aponta que 40% das tarefas administrativas podem ser automatizadas até 2025. No Tribunal de Justiça de São Paulo, o uso de RPA reduziu o tempo de processamento de documentos em 70% (TJ-SP, 2023).
Carreiras Fiscais e Tributárias
- Funções: Auditoria, fiscalização, análise de impostos.
- Tecnologias: Blockchain para rastreamento de transações e big data para identificar padrões de fraude.
- Exemplo: A Receita Federal já utiliza IA para cruzar dados bancários e fiscais, identificando inconsistências em 0,2 segundos por declaração. Isso reduziu a necessidade de auditores humanos em 15%(Fazenda, 2023).
Carreiras de Educação e Saúde
- Educação: Plataformas de EaD (Ensino a Distância) e tutoriais por IA personalizados.
- Saúde: Telemedicina e prontuários eletrônicos com diagnósticos auxiliados por IA.
- Impacto: Segundo o IPEA (2023), 20% das atividades burocráticas em hospitais públicos já foram automatizadas. No Amazonas, o projeto "Telessaúde" reduziu em 30% a necessidade de médicos presenciais em áreas remotas (SUS-AM, 2022).
Carreiras Jurídicas
- Funções: Análise de processos, redação de pareceres.
- Tecnologias: IA generativa para redação de documentos e machine learning para prever decisões judiciais.
- Dado: O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) relatou em 2023 que 30% dos processos do TJ-DF foram analisados por sistemas de IA, liberando juízes para casos complexos.

Impacto Econômico nos Estados e Municípios
Distrito Federal: O Epicentro da Dependência Pública
O DF possui 30% dos empregos formais vinculados ao setor público (Codeplan, 2023). A economia local é estruturada em torno de 300 mil Servidores, tanto no âmbito local, quanto Federal, distribúidos da seguinte forma:
- Servidores concursados: 250 mil (40% da força de trabalho formal).
- Cargos comissionados: 50 mil (8%), incluindo funções políticas e de gestão. Mas afinal, qual é o impacto Sócio-Econômico que o avaço exponencial da automação pode causar nos empregos e no volume de dinheiro que circula na economia do Distrito Federal ? Faço essa pergunta e apresento os dados pois considero que a Sociedade deveria pressionar urgentemente os mandatários para um processo inadiável de Transição Econõmica e Social do DF. Baseado nos números à seguir, considero haver uma certa acomodação por parte das lideranças locais ou mesmo uma visão estreita sobre os riscos previsíveis para os próximos 5 a 10 anos. Vejamos:
- Massa Salarial: R$ 12 bilhões/ano circulam na economia via salários públicos. Uma redução modesta de 20% nos concursos (não reposição de aposentados, afastados etc), por conta dos avanços das automações, significaria perder R$ 2,4 bilhões/ano em circulação nos próximos 5 anos.
- Comércio e Serviços: 45% das microempresas dependem dos Salários dos Servidores (Sebrae-DF, 2022). Setores como por exemplo, o imobiliário(30% dos aluguéis são para servidores) e educação privada(50% dos alunos são filhos de funcionários públicos) seriam severamente impactados.
- Desigualdade Social: 70% dos servidores do DF pertencem às classes B, C e D. O desemprego ampliaria a informalidade, já em alta (18% em 2023, segundo a Codeplan).
Previsão:
- Projeção de queda de 25% na massa salarial pública até 2033.
- Setor imobiliário pode sofrer desvalorização de 15% em regiões como Águas Claras e Sudoeste.
O valor total do Orçamento do Distrito Federal em 2025 é de R$ 66,6 bilhões, com R$ 41,6 bilhões de receitas próprias. Essas receitas próprias são em maior parte dependentes da massa salarial das carreiras de Estado. O montante é acrescido dos R$ 25 bilhões originários do Fundo Constitucional do DF (FCDF). Nos últimos anos a bancada federal do DF precisou se desdobrar em conjunto com o Buriti mais de uma vez, para tentar blindar as perdas significativas de receita desse montante repassado pelo Fundo Constitucional devido a alteração nos cálculos e ameaças de cessação do próprio repasse. Em abril, será celebrado o sexagèsimo quinto ano da Capital da República. Até aqui foi possível contornar os riscos à sobrevivência do caixa. Contudo, enquanto o nível de vulnerabilidade cresce ano após ano, quais são efetivamente as medidas, o pacto entre as lideranças empresariais e das instituições de apoio ao empreendedorismo/formação da mão de obra, com a classe política local, em torno de um Plano de Transição? Em que ano a autonomia financeira do DF baseada na própria geração de riqueza, emprego, renda e tributos terá possibilidade de ser alcançada? Qual é o Plano para isso? Quais são os Estudos Vocacionais, as Metas assumidas pelos diversos atores para assegurar essa possível virada? Quem lidera esse tema tão ausente dos pronunciamentos políticos e da mobilização dos empresários?
A própria Tecnologia e as Ciências da Vida podem capitanear a Solução
Comparo essa realidade com o que fez o pequeno país sulamericano, o Chile. Compreendendo que sua economia sempre baseou-se em uma commoditie mineral, notadamente o cobre, do qual a dependência era imensa, e em menor proporcão da exportação de frutas e vinhos, trataram de criar um Fundo Soberano, o "Fundo do Cobre". Aproveitando enquanto essa riqueza ainda lhes assegura provimento financeiro para o desenvolvimento do país, passaram a aplicar os recursos do fundo na diversificação da economia. Setores como o de Tecnologia da Informação e Ciências da Vida, capazes de proporcionar valor agregado e empregos alta qualificados foram fomentados e hoje já alcançam 50% do valor gerado pelo segmento agrícola.
O Distrito Federal segue com o repasse do Fundo Constitucional e da Massa de Salários Públicos e é justamente por isso que se exige, enquanto há fôlego de Caixa, que haja compromisso com as gerações futuras da Capital Federal. A Transição precisa ser iniciada agora! O Tempo urge!

Outros Estados com Alta Dependência de Serviços Públicos,
- Rio de Janeiro: 25% dos empregos formais são públicos (IBGE, 2023). A automação na área fiscal (ex.: Nota Fiscal Eletrônica) já reduziu 12% dos postos de trabalho na Secretaria da Fazenda estadual.
- Bahia: Em cidades como Salvador, 35% da economia local depende de repasses federais e estaduais. A digitalização de serviços como IPTU e licenciamentos ameaça 8 mil empregos administrativos até 2027 (SEI-BA, 2023).
- Pará: Municípios como Belém têm 40% da população economicamente ativa vinculada a cargos públicos municipais. A automação na saúde (prontuários digitais) pode eliminar 1.500 postos até 2030.
Municípios Pequenos e Médias Cidades
- Exemplo 1: Em Teresina(PI), 50% dos empregos formais são públicos. A migração para plataformas digitais de atendimento (ex.: emissão de alvarás online) já reduziu 15% das vagas em secretarias municipais.
- Exemplo 2: Em Blumenau(SC), onde 20% dos empregos são públicos, a automação na área educacional (plataformas de ensino híbrido) diminuiu a necessidade de servidores administrativos em 10% desde 2020.
Mas será que é real essa tendência de que a automação reduzirá o número de concursos públicos, imapctando Sindicatos, Associações e Conselhos ligados às Carreiras Públicas?
Redução de Concursos Públicos: Dados e Tendências (2018–2025)
1. Nível Federal
- 2018: 5.000 vagas abertas.
- 2022: 1.200 vagas (queda de 76%, fonte: Ministério da Economia).
- Projeção 2025: 800 vagas (dado preliminar do Planejamento, 2023).
Possíveis Motivos:
- Expansão do Portal Gov.br, que centraliza 3.800 serviços digitais.
- Corte de custos: Cada servidor federal custa em média R$ 120 mil/ano (Tesouro Nacional, 2023).
2. Nível Estadual e Municipal
- Estadual: Redução média de 40% nas vagas desde 2020 (FGV, 2023). No RJ, os concursos caíram de 3.000 vagas (2018) para 1.100 (2023).
- Municipal: Em cidades como Curitiba, a digitalização de serviços reduziu concursos em 50% na área administrativa (Prefeitura de Curitiba, 2022).

Comprovações da Tendência de Automação:
Serviços Digitais em Expansão
1. Portal Gov.br: 3.800 serviços, como emissão de CPF e certidões, atendendo 90 milhões de usuários (2023).
2. Detran Digital: 90% dos serviços de licenciamento são online (Denatran, 2023).
3. e-SUS (Saúde): Prontuários eletrônicos em 80% dos municípios (DATASUS, 2023).
4. Poupatempo (SP): Atendimento presencial caiu 60% após digitalização (Governo de SP, 2022).
Investimentos em Tecnologia
- O governo federal destinou R$ 1,2 bilhão para projetos de IA e automação em 2023 (Ministério da Ciência e Tecnologia).
- Estados como Minas Gerais e Rio Grande do Sul criaram "quartéis digitais" para treinar servidores em ferramentas tecnológicas.
Cenário para os Próximos 10 Anos
1. Redução de Vagas:
- Até 30% em carreiras administrativas (ex.: atendentes, digitadores).
- 15% em áreas técnicas (ex.: auditores, analistas).
2. Novas Profissões:
- Especialistas em IA, analistas de dados e gestores de plataformas digitais.
- Servidores multifuncionais, com habilidades em tecnologia e gestão.
3. Impacto Social:
- Desigualdade: Classes B, C e D, majoritárias no serviço público, enfrentarão desemprego estrutural.
- Economia Local: Comércios fecharão em cidades dependentes de servidores (ex.: Brasília, Teresina).

Gilberto Namastech - Futurista
A substituição de servidores por tecnologias é inevitável em funções repetitivas, mas exigirá equilíbrio entre eficiência e impacto social. No DF e em estados/municípios dependentes do setor público, a transição demandará:
- Políticas de requalificação: Cursos técnicos em TI e Empreendedorismo para servidores.
- Diversificação econômica: Incentivo a startups e indústrias locais.
- Proteção social: Redes de apoio a desempregados e incentivos fiscais para empresas afetadas.
A automação não extinguirá o serviço público, mas o redefinirá, privilegiando habilidades técnicas e adaptabilidade. O desafio será evitar que a modernização aprofunde desigualdades em regiões já vulneráveis.
Gilberto Lima Junior é Consultor, Palestrante e Membro do Board de diversas empresas no Brasil e no Exterior, na temática de Futuro, Estratégia e Desenvolvimento de Negócios. Conferencista contratado por inúmeras Organizações Públicas e Privadas na temática da Transição Humana e Digital. Redes Sociais: @gilbertonamastech
Fontes Consultadas:
- IBGE (2022). Pesquisa de Informações Básicas Municipais.
- Ministério da Economia (2023). Relatório Anual de Concursos Públicos.
- Codeplan (2023). Perfil Socioeconômico do Distrito Federal.
- Sebrae-DF (2022). Impacto Econômico dos Servidores Públicos.
- TJ-SP (2023). Relatório de Automação de Processos.
- DATASUS (2023). Relatório de Implementação do e-SUS.