Criado pelo Ministério da Saúde
para orientar profissionais de saúde no diagnóstico de Covid-19
, o aplicativo TrateCov já está envolto em polêmicas com apenas uma semana de uso. Primeiro, por sugerir o tratamento precoce com remédios sem eficácia comprovada, como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina.
Ademais, o app pode ser acessado por qualquer pessoa. E ainda, as políticas de uso e privacidade de dados da plataforma são pouco claras e sem respaldo na Lei Geral de Proteção de Dados ( LGPD ), conforme reporta o Uol.
Ao ser descoberta por jornalistas e especialistas da área da saúde no Twitter , a plataforma serviu de teste para várias pessoas fazerem simulações com perfis diferentes de pacientes fictícios.
Segundo os testes informais realizados pelo público, o TrateCov indica para tratamento precoce os seguintes medicamentos: ivermectina, cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina, sulfato de zinco, doxiciclina, zinco e dexametasona. As diferenças nos resultados das simulações estavam na alteração na dosagem, que varia conforme o peso do paciente indicado no formulário.
Ao examinar o aplicativo , o jornalista de dados Rodrigo Menegat conseguiu fazer uma cópia do código do mesmo. Ele reparou que havia oito medicamentos no código fonte para o tal tratamento precoce.
Já o desenvolvedor Lucio Maciel decifrou o sistema de pontuação do TrateCov . Dependendo das condições clínicas citadas no formulário, o paciente pode obter uma soma em que há a sugestão do uso de medicamentos.
Ou seja, se uma pessoa saudável apresenta dois sintomas quaisquer (como dor de cabeça e cansaço, por exemplo), já é sugerido o tratamento precoce.
Para Hiago Kin, presidente da Associação Brasileira de Segurança Cibernética, seria preciso mais testes para comprovar se o sistema está condicionado a indicar apenas tratamento precoce contra a Covid-19 . “Ele [o programador Rodrigo Menegat] exibiu o código fonte da página já pronta com o resultado, e não do algoritmo. É uma teoria sem prática estatística comprovada, embora o TrateCov não deixe claro suas lógicas”, argumenta ao Uol.
Em resposta, o Ministério da Saúde informou por nota que o TrateCov sugere “opções terapêuticas disponíveis na literatura científica” e “oferece total autonomia para que o profissional médico decida o melhor tratamento para o paciente”. Sobre os medicamentos citados, o ministério diz que a lista “pode sofrer alterações de acordo com os estudos científicos em andamento”.
Política de uso de dados
O TrateCov foi desenvolvido pela Universidade Vanderbilt, de Nashville, nos EUA, e está hospedado em um sistema chamado Redcap (Research Electronic Data Capture). Segundo a plataforma, cabe ao desenvolvedor de cada empresa ou entidade que usa o sistema informar sobre o tratamento de dados das pessoas envolvidas.
No app
não há nenhuma menção sobre como os dados
seriam tratados —se seria apenas para ajudar no diagnóstico ou se seriam armazenados. O TrateCov pede informações como nome, data de nascimento, telefone, entre outros dados pessoais.
“O governo e a aplicação agem como se fossem titulares dos dados, e não controladores, que necessitam pedir o consentimento ao explicar a finalidade de uso”, avalia Kin. Para ele, apesar de a LGPD já estar vigente no país e o governo ser responsável por fiscalizá-la, “o governo não dá o exemplo”.