Desde que começou a investir no metaverso e até mudar o nome do Facebook Inc. para Meta, em outubro passado, Mark Zuckerberg chamou para si a construção desse conceito, que mistura os mundos físico e virtual. Mas eis que a Microsoft, na maior aquisição da história da empresa , veio mostrar literalmente que está no jogo ao comprar a Activision Blizzard por US$ 68.7 bilhões. A companhia americana é a criadora dos games “Call of Duty”, “World of Warcraft”, “Guitar Hero” e “Candy Crush”, entre outros títulos de sucesso.
O negócio coloca a empresa fundada por Bill Gates em ótima posição entre as big tech na disputa por essa nova fronteira, já que as grandes experimentações do metaverso têm ocorrido, prioritariamente, no universo gamer. O “Call of Duty”, um dos jogos de maior sucesso do portfólio da Activision, é um exemplo disso. Seus avatares, com diferentes skins comercializáveis (uma espécie de visual, que individualiza cada jogador), socialização em rede e sensação de presença com realidade virtual, são algumas dos elementos que tem sido usados para descreverem as tentativas atuais de se chegar nessa fusão do físico e digital. A turma que joga esse tipo de game é altamente disposta a propor, testar e difundir tecnologias, algo fundamental na construção dessa nova experiência.
"O metaverso vai ser construído em comunidade. Agora a Microsoft consegue ainda mais contato com os gamers, um grupo extremamente engajado", diz Thiago Savoldi, especialista em marketing e inovação, citando o poder de influências dessa turma nas redes sociais. "Quando analisamos as métricas de determinados nomes, não vemos uma quantidade gigante de seguidores, mas o engajamento é muito maior do que o de influenciadores tradicionais. O poder deles é altíssimo."
Não que a Microsoft seja “virgem” nesse ramo. Ela lançou o console Xbox em 2001 e já adquiriu duas grandes empresas de games. Em 2014, comprou a Mojang, criadora do “Minecraft”, por US$ 2,5 bilhões; e no ano passado, a ZeniMax Media, de “Doom” e “Fallout”, por US$ 7,5 bilhões. O “Minecraft” junto com “Roblox” e “Fortnite”, é sempre exemplo de jogos populares, principalmente entre crianças e adolescentes, com pitadas desse metaverso embrionário.
"O metaverso funciona baseado nas experiências que você consegue proporcionar lá dentro. E a partir do momento em que a Microsoft tem vários títulos que as pessoas amam, ela vai ter mais poder sobre essas experiências. Se você quiser criar uma imersão dentro do “Call of Duty”, vai precisar passar pela Microsoft", diz Claudio Lima, CEO da Druid, empresa de creative gaming, que esteve na semana passada na Rio Innovation Week.
Essa transação não deixa dúvida de que a Microsoft, ao focar em games, planeja um caminho bem diferente da Meta de Zuckerberg. O dono do Facebook tem investido em hardwares como os óculos de realidade virtual Oculus Quest, e softwares, como o app de home office Horizon Workrooms, para criar um metaverso baseado em interações sociais.
"A Meta criou um perfil distinto de atuação. Suas comunidades viram em torno de experiências sociais", diz Thiago.
Outros objetivos
Os interesses envolvidos numa bolada de quase US$ 70 bilhões não ficam restritos apenas a um ativo. O metaverso é importante, mas, como Phil Spencer, CEO do Xbox e da divisão de games da Microsoft, disse em entrevista à “CNBC”, o que ele viu de mais valiosa na negociação, que será concluída efetivamente depois de 18 meses, são as mentes criadoras e programadoras da Activision.
“O mais importante são as equipes que criaram algumas das franquias de jogos mais amadas do mundo. Esse é todo o futuro desse negócio”, disse Spencer. O CEO chega à empresa após denúncias de diversos funcionários da Activision sobre assédio e discriminação promovido por altos executivos. Os acusados teriam sido demitidos na véspera da compra.
Essa equipe a que Spencer se refere está por trás de um dos jogos mais populares do mundo, o “Candy Crush”, com uma fanbase leal de 250 milhões de usuários, segundo o site “Business of apps”. Em 2021, teve uma receita de US$ 1,2 bilhão segundo a consultoria “Sensor Tower”.
"Todo o aprendizado da Activision no “Candy crush” é importante, especialmente no que diz respeito à democratização de jogos e acessibilidade no celular, um dos pilares dos planos da Microsoft", diz Thiago Savoldi.
Claudio Lima acredita que o “Candy Crush” é importante também para trazer dados e, claro, dinheiro.
"Quase 70% das pessoas têm esse tipo de jogo, que chamamos de “casual games” no celular. Eles são ferramentas gigantes de publicidade e um lugar onde os usuários gastam constantemente. Então, a Microsoft terá esses dados, além dessa receita contínua, num jogo cujo investimento já foi todo feito", diz Claudio.