Quando o engenheiro Tim Berners-Lee sugeriu ao laboratório CERN onde trabalhava a criação da Word Wide Web em 1989, ele dificilmente imaginava onde a sua ideia poderia chegar. Muitos anos depois, vendo a dimensão de sua criação e de empresas que se criaram no mundo digital como Facebook, Google e Amazon, o "inventor da internet" defendeu que era “hora de reconhecer a internet como um direito humano básico”.
Leia também: AlterEgo é um dispositivo da MIT capaz de "ouvir" mente de usuário e respondê-la
Na ocasião, o engenheiro fez questão de explicar que não se trata de torná-la 100% gratuita, mas de "garantir a internet a um custo acessível, garantindo que os pacotes de dados sejam fornecidos sem discriminação comercial ou política e protegendo a privacidade e a liberdade dos usuários da web onde quer quer eles estejam", disse em 2014.
Os desdobramentos atuais da rede, porém, estão colocando em xeque pelo menos uma dessas duas coisas: ou os usuários tem acesso a um serviço gratuito, mas precisam oferecer seus dados em troca, ou precisam pagar por eles.
A forma como a internet se desenvolveu foi sustentada durante muito tempo quase que exclusivamente com verba de publicidade. Os sites disponibilizavam informações e incluíam anúncios para pagar pela operação. Aos poucos, porém, as métricas foram melhorando, os valores foram diminuindo e gigantes como Google e Facebook dominaram cada vez mais esse mercado. As estimativas são de que em 2017, apenas essas duas empresas tenham sido responsáveis por vender de 60% a 70% de todos os anúncios digitais do mundo.
Principalmente por isso, boa parte dos serviços prestados por elas são gratuitos ao consumidor. A Alphabet, empresa dona do Google, além do foco principal no seu buscador na internet, oferece mapas, email, e navegador próprios de graça. Já o Facebook, além da própria rede homônima, é proprietária de outros serviços digitais que não custam nada aos usuários como o Instagram e o WhatsApp.
Leia também: Criador do WhatsApp sugere que usuários excluam suas contas do Facebook
No melhor estilo "quando você não paga por algo é você que está sendo vendido", essas empresas comercializam a sua atenção para os anunciantes. E coletando seus dados, elas conseguem oferecer o público cada vez mais certeiro para as propagandas que pagam para aparecer para eles. Simplificadamente, foi assim que ambas cresceram e fundaram um novo momento econômico que vem sendo chamado de "economia da atenção".
Porém, os mais recentes vazamentos de dados do Facebook colocaram esse modelo – ou pelo menos a empresa de Zuckerberg – no centro de uma discussão a respeito de violações de privacidade e autonomia digital. Reconhecendo, por exemplo, que coleta dados até de pessoas que não estão presentes na rede social, o Facebook se vê em meio a uma polêmica que não tem prazo para acabar. Muitos especialistas afirmam que chegamos a um estágio que não é mais possível voltar atrás: precisamos conversar sobre o acesso aos nossos dados imediatamente.
Como alternativa, diante do sucesso de plataformas e veículos que estão "se fechando" atrás de paywalls ou outros tipos de modelo de assinatura, uma dúvida surgiu na cabeça das pessoas: será que estamos dispostos a pagar para utilizar esser serviços? E será que as empresas estão dispostas a receber por isso? As respostas começam a aparecer.
As empresas querem ser pagas?
Recentemente, Mark Zuckerberg foi questionado sobre isso. A ocasião foi justamente no depoimento que ele foi convidado a prestar diante do Congresso Americano para esclarecer o vazamento de dados de mais de 87 milhões de pessoas através de uma brecha na sua plataforma.
Ele foi interpelado por um senador sobre a possibilidade de criar uma versão paga de sua principal rede social para que os usuários não precisassem mais oferecer seus dados em troca do serviço. Zuckerberg respondeu:
"Queremos oferecer um serviço gratuito para atingir o maior número de pessoas, e essa é a forma que temos atualmente. Facebook com propaganda é mais alinhado com a nossa missão de conectar pessoas. As pessoas podem controlar se querem propagandas personalizadas ou não, mas vimos que elas não gostam de propagandas inúteis. Para não mostrar anúncio nenhum, nós ainda precisaríamos de um modelo de negócio," disse.
Leia também: Zuckerberg pede desculpas ao Congresso americano e anuncia mudanças no Facebook
Por essa resposta, é possível deduzir que essa realidade não está tão próxima assim. Num outor momento do depoimento, porém, Zuckerberg chegou a se referir ao atual Facebook como uma "versão gratuita" da rede social, aumentando os rumores de que a empresa já está rascunhando um alternativa paga aos serviços prestados. Tudo, é claro, sigilosamente.
Os consumidores querem pagar?
De qualquer forma, a curiosidade é grande para saber se, na outra ponta, os próprios usuários estariam dispostos a pagar para usar a rede social. E foi exatamente essa pesquisa que os economistas do MIT e da Universidade de Groningen decidiram fazer. Eles mediram o valor desses produtos digitais gratuito pela opinião das pessoas e publicaram um artigo pelo National Bureau of Economic Research, com as conclusões.
O método dos pesquisadores consistiam em perguntar às pessoas se elas prefeririam ter acesso a um serviço ou receber uma certa quantia de dinheiro. No caso do Facebook, eles perguntaram às pessoas se prefeririam US$ 10 ou desistir da rede social por um mês. O valor recebido variava em incrementos entre US$ 1 e US$ 1.000, até descobrirem qual era o "preço" do serviço para cada um.
Para manter as pessoas honestas, os pesquisadores disseram aos entrevistados que um entre 200 entrevistados teria sua escolha reforçada já que um experimento complementar descobriu que a ameaça de execução é necessária para obter respostas honestas.
Em 2016, eles entrevistaram cerca de 1.500 pessoas e descobriram que metade delas aceitava largar o Facebook por um mês apenas com valores acima de US$ 50. Em 2017, eles realizaram o mesmo experimento e disseram que o valor estava mais perto de US$ 40. O que pode ser um indício de que o Facebook se desvalorizou perante as pessoas ou uma variação ocasional já que, eles reconhecem, a amostra da pesquisa não é grande o suficiente para se tornar representativa.
De qualquer forma, os pesquisadores usaram uma metodologia semelhante para estimar o valor de um ano de e-mail gratuito como o Gmail ( US$ 8.400), mapas digitais como o Google Maps (US$ 3.600) e sites de comércio eletrônico como o da Amazon (US$ 840). Eles sabem que os resultados podem não ser conclusivos, mas esperam ter colocado uma pulga atrás da orelha das pessoas, tanto para realizar outras pesquisas com estimativas mais precisas, quanto para imaginar um cenário em que a internet pode ser menos invasiva, porém mais cara.
Leia também: Governo pede explicações ao Facebook sobre vazamento de dados de brasileiros
No seu caso: quanto você estaria disposto a pagar por um mês de Facebook ?